Banco Central vê inflação ‘absolutamente tranquila’
Previsão é de recessão de 5% neste ano e expansão de 3,9% em 2021
Por Estevão Taiar, Fabio Graner e Alex Ribeiro
O Banco Central considera absolutamente tranquilo o cenário de inflação e avalia que as pressões recentes sobre os preços devem ficar circunscritas a este ano, sem contaminar o próximo. O quadro favorável à manutenção dos juros baixos é confirmado por um conjunto de projeções de inflação que mostra uma trajetória de preços abaixo ou próxima da meta até 2023.
“A mensagem geral é que estamos tranquilos”, disse o presidente Roberto Campos Neto na entrevista coletiva de divulgação do Relatório Trimestral de Inflação (RTI). No documento, são apresentadas projeções e análises qualitativas sobre o cenário macroeconômico que embasam as suas decisões sobre juros.
Neste ano, alguns fatores específicos vêm empurrando para cima os preços, disse Campos. Entre eles, a alta de preços em reais de commodities e o aumento do consumo provocado pelo auxílio emergencial. “Não entendemos que isso vá contaminar as inflações futuras”, sustentou. “O Banco Central tem uma situação de absoluta tranquilidade em relação à inflação.”
O diretor de política econômica, Fabio Kanczuk, reforçou a mensagem, dizendo que, dada a ociosidade da economia, é “muito improvável” um repasse da inflação de 2020 para 2021.
Ele destacou que, entre os diversos cenários que constrói para projetar a trajetória de inflação, o BC vem olhando atualmente mais para aquele que leva em conta a taxa de juros do boletim Focus e o câmbio constante.
Nesse caso, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) seria de 2,1% em 2020, 2,9% em 2021, 3,3% em 2022 e também 3,3% em 2023. O horizonte relevante para a política monetária inclui 2021, principalmente, e em menor grau 2022. Nos dois anos, a inflação a ser alcançada é de 3,75% e 3,5%, respectivamente.
Ou seja: em ambos os casos, a variação dos preços ficaria abaixo da meta. Somente em 2023, que ainda não faz parte do horizonte relevante, a inflação superaria um pouco a meta (3,25%). O risco maior, mostra o documento, é a inflação ficar muito baixa. A chance de a inflação furar o piso da meta deste ano, que é de 2,5%, são de 76%, mostra uma das projeções apresentadas no RTI. Por outro lado, o risco de estourar o teto da meta, de 5%, são próximas de zero.
No documento, o BC ainda revisou a sua projeção para a queda do PIB deste ano, de 6,4% para 5%. De acordo com Kanczuk, tanto a autoridade monetária quanto os economistas em geral estão se surpreendendo positivamente com a velocidade de retomada da atividade no Brasil.
“Há surpresas em quase tudo”, afirmou. A má notícia, segundo ele, vem do consumo do governo, em função de ajustes metodológicos feitos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para captar os efeitos da pandemia.
Para 2021, a estimativa é de alta de 3,9%, maior do que o projetado pelo Ministério da Economia (3,2%) e pelo mercado (mediana de 3,5%, de acordo com o Focus). “É um cenário de crescimento bom”, afirmou Kanczuk. Mas, mesmo assim, deverá levar um bom tempo para a economia curar as feridas criadas na pandemia. Para Kanczuk, provavelmente apenas em 2022 a atividade econômica retornará ao nível anterior à crise atual.
O Banco Central também apontou alguns riscos que estão no caminho da recuperação econômica. Um deles é se a economia vai se sustentar depois de cessado o pagamento de benefícios emergenciais pelo governo. Durante a pandemia, a população passou a poupar mais. A reversão dessa poupança para o consumo poderá ajudar mais adiante. Outro risco é a trajetória das contas fiscais. “É preciso que haja confiança”, lembrou o presidente do Banco Central.
O BC anunciou uma mudança nas projeções de inflação que divulga nos seus documentos. Em vez das projeções que levam em conta as taxas de câmbio constante e a prevista pelo mercado, vai publicar apenas uma em que o dólar é atualizado pela diferença entre a inflação doméstica e a internacional (a chamada paridade do poder de compra, ou PPC).
As mudanças, segundo Kanczuk, vão valorizar as projeções mais relevantes para a política monetária. O BC promete complementar com informações que vão permitir ao mercado calcular o quanto a inflação responde a variações nos juros e câmbio. Kanczuk disse que a diferença entre o cenário com o PPC e o com o câmbio constante é de 0,1 ponto percentual no horizonte relevante para as decisões sobre juros.
Fonte: www.valor.globo.com
Acessado em: 25 Setembro 2020, 09:10:54.