Brasil vive a renascença do empreendedorismo, diz GA
A gestora americana de private equity General Atlantic (GA) criou um cargo de presidente do conselho de administração no Brasil. O posto será ocupado por Pedro Parente, que comanda o conselho e a administração da empresa de alimentos BRF e já presidiu a Petrobras e a Bunge Brasil.
A proposta é reforçar o time sênior local para mentoria das empresas em crescimento no portfólio – como a Gympass, que se tornou internacional, ou a Arco Educação, que acaba de fazer uma grande aquisição. “Precisamos de gente de cabelos brancos, ou já sem cabelos, para ajudar as companhias no crescimento”, diz o bem-humorado Martin Escobari, que comanda a gestora na América Latina, provocando uma gargalhada de Parente. “É um time muito talentoso, mas jovem em média”, explica o executivo brasileiro, que assumirá como chairman em 18 de junho – mantendo a cadeira na BRF e também a sociedade recém-anunciada na gestora EB Capital.
A atenção local da GA não é à toa: o Brasil é o hoje o mercado com maior retorno global para a gestora, sendo que responde por apenas 11% do portfólio. Em 20 anos de presença no país, investiu pouco mais de US$ 2 bilhões em 12 empresas. Foram nos últimos anos que os resultados aumentaram consideravelmente. O retorno anualizado líquido é de 27% em dólares, ou 40% em reais.
A XP Investimentos, empresa em que a GA vendeu participação ao Itaú mas manteve uma fatia, deve se tornar o maior retorno histórico global da gestora. “Provavelmente vai ultrapassar o retorno líquido que tivemos com a Alibaba, de US$ 1,5 bilhão”, diz Bill Ford, presidente global da GA. “Temos retorno considerável na região, lembrando ainda que isso aconteceu com o país em recessão.”
A firma americana tem se especializado, no Brasil e no mundo, em empresas disruptivas – companhias da chamada nova economia. Tem Uber, Slack, Airbnb no portfólio e vem refinando essa nova análise de métricas e precificação para descobrir grandes negócios – mesmo que alguns dos mais promissores ainda não gerem resultados.
Ford usa o Uber como exemplo. “Em Paris e Nova York, o Uber é lucrativo. No agregado, perde dinheiro porque está abrindo mão de margem por crescimento, mas o modelo de negócio funciona. Não é diferente, no Brasil, do Quinto Andar “, compara Ford, citando a startup brasileira de intermediação de aluguel de imóveis. “Quando investimos no Quinto Andar, a empresa tinha um modelo viável em São Paulo. Agora está em 30 cidades e há um período de ajuste natural nos números”, complementa Escobari.
O Uber fez sua oferta inicial de ações (IPO) na semana passada e, desde então, vem afundando na bolsa americana. A GA não costuma olhar a performance de curto prazo, ressaltam, uma vez que não tem período determinado para sair – diferentemente de outros fundos de private equity, que tem veículos com duração de 10 anos, por exemplo.
Na definição dos executivos, a GA busca negócios que tenham grandes mercados potenciais, que resolvam grandes problemas e que tenham um modelo que, diante do ataque da concorrência, consiga se perpetuar. “E tem que dar dinheiro”, ressalta Escobari, indicando que a tolerância para abrir mão de rentabilidade é limitada. Além disso, como a GA não assume o controle das operações, precisa ter uma equipe flexível.
“Temos muita convicção na estratégia de explorar a transição para economia digital e o que estamos tentando fazer é ter especialização nessa transição”, diz Ford. “Muitos empresários no Brasil estão resolvendo problemas que são aplicáveis fora. Acabamos de discutir com uma companhia local sobre como esse negócio funcionaria bem na Indonésia.”
Eles também destacam um ajuste na proporção dos mercados. Se há duas décadas os Estados Unidos eram destino principal de negócios, hoje 60% dos investimentos estão fora do mercado americano e, desses, 30% estão em países emergentes, como China, Brasil, México, Índia e Indonésia. “No passado recente, 80% das companhias que virariam unicórnios eram criadas no Vale do Silício, na Califórnia. Esse número hoje é menor que 20%”, diz Escobari.
Para a GA, o Brasil vive “a renascença do empreendedorismo”, graças à tecnologia. “Há dez anos, os melhores e mais brilhantes no país não iam para empresas em estágio inicial ou empreendiam”, diz Escobari. “São pessoas que, pela qualidade da formação, perseguiriam carreira em grandes companhias. É um tipo de revolução que está acontecendo”, avalia Pedro Parente.
Bill Ford vê um paralelo entre o que acontece no Brasil e na França. “Em mais de 20 anos na Europa, nunca tínhamos investido na França porque os novos talentos iam trabalhar no governo ou em empresas estatais. Isso mudou depois da crise financeira, e o empreendedorismo passou a ser uma alternativa. Vemos isso no Brasil: jovens talentosos perseguindo um propósito e criando modelos de negócios que reflitam isso”, diz.
Crescendo no mercado brasileiro com novos modelos e atraindo o capital de fundos, as companhias ganham força também para expansão internacional. A Gympass, que só atuava no Brasil, está hoje em 15 países – no primeiro ano nos Estados Unidos a empresa montou uma rede de academias no primeiro ano oito vezes maior do que no primeiro ano de Brasil. Criar escala e unificar culturas é um desafio para os jovens empresários, na avaliação da gestora – por isso a proposta é dar suporte nesse processo.
Quando a GA investiu na Arco Educação, a companhia fornecia conteúdo para 8 mil estudantes. Com expansão orgânica e uma capitalização via oferta de ações na Nasdaq, a Arco comprou em maio o grupo Positivo por R$ 1,65 bilhão e, atualmente, tem 1,2 milhão de estudantes. “Dobramos o volume de escolas, multiplicamos o número de alunos, agora precisamos criar uma cultura comum, de escala nacional, com essa aquisição”, diz Escobari. “É um desafio enorme, em que o Ari [de Sá Neto, presidente da Arco] terá nossa ajuda.
” Uma lição que esse processo de transformação digital tem colocado às empresas, para Ford, é sobre regulação – que comumente gera debate e risco financeiro. “O Uber e o Airbnb têm que lidar com jurisdições unicipais e acho que, em ambos os casos, eles aprenderam que precisam investir nessas relações e ter pessoas no time dedicadas a essas questões”, diz o presidente da gestora. “Toda vez que um negócio for disruptivo irá, por definição, contra os interesses do modelo de negócio existente, das empresas tentando defender sua parte.”
Fonte: www.valor.com.br
Link: https://www.valor.com.br/financas/6255647/brasil-vive-renascenca-do-empreendedorismo-diz-ga. Acessado em: 15 Maio. 2019, 10:08:21.