‘Tecnologia é vetor de expansão para empresa local’
Para John Moore, presidente do Morgan Stanley na América Latina, as companhias com recuperação rápida são as mais digitais ou que conseguiram ficar ainda mais digitais com a crise
Por Maria Luíza Filgueiras
A necessidade de ajuste rápido nos modelos de negócios provocada pela pandemia serviu de alerta para as companhias brasileiras para o que John Moore, presidente do Morgan Stanley na América Latina, define como tendências seculares. No mercado de ações, significa olhar para o longo prazo e padrões de consumo futuros, que se refletirão no valor daquela empresa.
Moore também acredita que o fato de a pandemia ter pego o Brasil em fase inicial de sua recuperação econômica será positivo para o ritmo de retomada. “O Brasil tem várias características únicas que explicam a performance atual do mercado de ações”, diz o executivo, referindo-se ao volume crescente de ofertas iniciais e subsequentes (IPOs e followons) no país.
Nessa lista, ele coloca empresas de grande porte e de diversificação acima da média latino-americana e cases de tecnologia que já atraíram a atenção de investidores globais. “As tendências seculares movem o mercado de ações e, no Brasil, isso está sendo bastante puxado por tecnologia, mesmo em atividades que não são parte das indústrias tradicionais”, diz. “As companhias com recuperação rápida são as mais digitais ou que conseguiram ficar ainda mais digitais com a crise, como processadoras de pagamentos, investimentos, companhias de software, soluções ligadas à saúde.”
Em sua avaliação, as companhias aceleraram seus projetos de digitalização, e o investidor aumentou o interesse no tema. Nessa linha, o banco coordenou os follow-ons da Stone e da XP e o IPO da Vasta Educação, os três em bolsa americana. São exemplos de que o investidor estrangeiro continua interessado em papéis brasileiros, segundo Moore.
“Mesmo no mercado doméstico, os dados da B3 mostram que os institucionais internacionais têm participação maior do que as pessoas pensam. Eles representam, em média, 48% do volume negociado, isso no mercado secundário, e no primário têm aumentado a proporção nos livros”, afirma. “Eles estão interessados nos grandes negócios, mas seletivos, por isso as emissões mais viáveis nesse cenário ainda de crise tendem a ser de líderes ou vice-líderes setoriais.”
Ele complementa que há também um retorno de atividade no mercado de dívida. Num primeiro momento, as companhias ficaram relutantes em aumentar alavancagem e aquelas já listadas ou com plano de listagem preferiram aproveitar os preços melhores em bolsa, avalia. “Mas provavelmente será um mercado ativo nos próximos meses, até pelo redução de juros, que torna o nível de preço atraente para os emissores”, diz.
Moore destaca que, antes da pandemia, o país estava no ciclo inicial de recuperação econômica enquanto outros países, como Estados Unidos e México, já estavam no ciclo final. “O Brasil tem ventos de cauda que deixam longe a tendência semipermanente de juros negativos”, diz. No Brasil, a projeção é de PIB voltando a crescer em 2021, mas o cenário atual de juros em mínima recorde e inflação ainda bem abaixo da meta deve manter a Selic na casa de 2% – em relatório, o banco afirma que há pouco espaço para novos cortes, por conta da deterioração fiscal.
A projeção do Morgan Stanley é um início de ciclo de alta de juros no quarto trimestre de 2021. Com a dívida chegando perto de ultrapassar 100% do PIB, ele complementa que os gastos relacionados à pandemia tornaram o desafio fiscal maior, mas que a boa notícia local é a retomada da agenda de reformas, como a tributária.
Nos Estados Unidos, economistas e estrategistas já estavam prevendo alguma recessão antes da crise. “E, com o volume de estímulo fiscal na pandemia, o debate é se veremos volta de inflação e se juros vão ou não subir. Isso afeta também o crescimento do mercado de ações, já que pode aumentar a taxa de desconto de fluxo de caixa futuro”, diz. Para Moore, o desenrolar desse cenário e também seu reflexo no câmbio dependem do desenrolar da eleição presidencial americana, notadamente pela abordagem comercial com a China.
“Esse evento em novembro pode rapidamente mudar a narrativa. Claramente o candidato Joe Biden tem mostrado intenção de acomodar as relações internacionais, mas os detalhes serão determinados por como chineses e outros parceiros comerciais reagirão a um novo presidente, se elegermos um”, diz Moore. Com investidores voltados às eleições, novembro pode ser um mês de redução em volume de emissões de ações, inclusive no Brasil, avalia.
Fonte: https://www.valor.globo.com/
Link: https://valor.globo.com/financas/noticia/2020/08/31/tecnologia-e-vetor-de-expansao-para-empresa-local.ghtml Acessado em: 31 Agosto 2020, 14:20:01.